Os defensores de Sócrates e a hipocrisia moral ou Kant de pernas para o ar

Não existe qualquer prazer em ver um ser humano em prisão preventiva. É verdade que em Portugal as regras conducentes à prisão preventiva são demasiado elásticas e utilizadas com demasiada displicência pelos juízes de instrução. 
Por estes motivos, não haveria muito a dizer sobre a prisão de José Sócrates que já não tivesse sido dito sobre outras prisões. A justiça da prisão preventiva de Sócrates tem que ser confrontada com o direito habitualmente aplicado e não com cânticos de passarinhos agastados com a queda da plumagem do seu líder.
Recentemente no julgamento da Universidade Independente, um distinto Professor que muito prezo, antes da audiência, dirigiu-se-me afirmando, agastado, que não gostava nada do que eu havia referido acerca de José Sócrates e a Universidade Independente numa televisão. E vai daí quando presta depoimento em sala, presta- o de forma enviesada, e em parte, de forma pouco consentânea com a verdade. 
Este Professor de Direito demonstrou o que se está a passar com os apoiantes de Sócrates: a hipocrisia moral. Todos são culpados antes de julgados, a todos as regras desta justiça que se tem deteriorado (em boa parte durante os longos consulados socialistas) se devem aplicar…excepto a José Sócrates. 
Aliás, dentro desta linha de argumentação está uma magistrada que escreveu no Expresso um artigo contra a condenação jornalística de Sócrates. Quantas vezes esta magistrada já tinha escrito contra condenações jornalísticas de outras pessoas? Mas, mais grave: como é admissível que uma magistrada escreva sob o manto do anonimato, quando pode vir a ter uma intervenção no processo de Sócrates (ou já teve, porventura nalgum dos processos que o afectaram)? Aqui temos um exemplo singelo que opacidade e dependência da justiça.
Justiça, que no caso de Sócrates andou durante anos a fio muito mal, enveredando-se na teia de cumplicidades políticas e oligárquicas que rodearam este governante. Basta referir o almoço de Pinto Monteiro com Sócrates nas Vésperas, ou a presença deste Conselheiro, bem como do antigo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça no lançamento dum suposto livro académico. Note- se que Sócrates (mesmo não falando no caso Freeport, em que pairou, mas nunca teve um papel formal) já tinha sido investigado no caso da licenciatura e teria um processo administrativo de anulação da licenciatura a correr, portanto, não poderia ser visto como afastado de toda e qualquer suspeita. Assim, as atitudes destes antigos próceres judiciais nas cerimónias adulativas socráticas tiveram um peso político claro e de comprometimento da alta magistratura.
Quando Sócrates encerrou sem piedade uma universidade e os seus dirigentes foram vilipendiados, quando Sócrates despediu brutalmente uma apresentadora da televisão que foi insultada em geral, quando Sócrates maltratou um assessor do Presidente da República de forma pouco digna, quem se levantou em defesa destas pessoas e de outras? Onde estavam os defensores da liberdade, da democracia, da presunção da inocência?
Esta é a questão moral que a prisão de José Sócrates levanta. A questão da hipocrisia e da duplicidade de critérios. Sócrates estudou Kant. Sabe então identificar o imperativo categórico kantiano:” Age como se a máxima da tua acção devesse tornar-se, através da tua vontade, uma lei universal”. Aquilo que foi a lei universal no tempo de Sócrates é a lei universal que lhe deve ser aplicada. Ou não?

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