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A mostrar mensagens de janeiro, 2016

Argumento pela extinção do Ministério Público

Quando foi estabelecido segundo o modelo alemão pela Constituição de 1976, o Ministério Público foi desenhado antes de tudo como um defensor da legalidade democrática. Isto é, acima de tudo o M.P. é um guardião do Direito. Essa a razão que o levou a considerar um órgão quase pertencente ao poder judicial , e não estritamente ligado ao poder executivo, o que tem levado os seus representantes a considerarem-se análogos à magistratura judicial e a falaram de uma autonomia quase encarada como independência. Na Alemanha Federal, também muitos consideraram que o M.P. no desenho da Lei Fundamental de 1949 deveria ser enquadrado no poder judicial. Todavia, talvez por influência norte-americana, que vigiou de perto a elaboração dessa lei, nunca saiu da esfera do poder executivo. No entanto, simultaneamente, as principais atribuições concretas do M.P. situam-se na esfera da acção penal. Ele desempenha as funções de chefe dos investigadores e acusador. Notoriamente, esta dupla função cria

Os (des) entusiasmos das presidenciais

Marcelo ganhou, era previsível. Confirmou a teoria do falecido Rangel que terá dito que a televisão pode fabricar um Presidente da República, como promove uma marca de sabonete, mas também a desconfirmou, porque Marcelo sempre foi mais que uma homem da televisão. O que a televisão terá feito foi modificar a percepção pública que havia de Marcelo como Mefistófeles, errático e desleal. Tornou-o num avôzinho inteligente e simpático, amável e afectuoso. O que não foi pouco. Duas coisas foram estranhas nas eleições: a elevada abstenção e a falta de comemorações populares na noite de Domingo. Não houve buzinas, multidões, apenas encenações. Na realidade, não houve entusiamo. Nenhum. Apenas conformação. É Marcelo, pronto. Menos mau. Pedro Passos Coelho traduziu esta sensação com o discurso fúnebre que realizou. Definitivamente, este foi uma espécie de acto fúnebre de uma democracia pouco participativa. Rui Verde

Doze apontamentos sobre as eleições presidenciais

Cavaco Silva – Teve dois mandatos dignos, deixa Belém a um Presidente diferente no estilo, na formação e na prática política. Marcelo Rebelo de Sousa é um bom sucessor de Cavaco, com a vantagem de ser jurista e especialista em direito constitucional. BE – Os bons resultados do BE nas legislativas e agora nas presidenciais não são estruturais. A amálgama trotzkistas – maoístas não garante um “bloco” homogéneo para sempre. “Espelho meu…” – Todos os nove candidatos perdedores foram dizendo que iriam à segunda volta ou que chegariam mesmo a vencer já ontem. Acreditariam mesmo nisso, precisariam de o dizer para se afirmarem pessoalmente e robustecerem psicologicamente, tiveram maus conselheiros ou havia motivos, insondáveis mas talvez legítimos, para insistirem na afirmação? Henrique Neto – O resultado de 0,8 por cento é muito mau, remetendo-o para esse cadinho de derrotados de fim da linha. Não merecia mas a democracia é assim.  Marcelo Rebelo de Sousa – Teve um triunfo pe

Presidenciais para quê?

Depois daquilo que foi o mandato de Cavaco Silva e a campanha para estas eleições presidenciais em que o apontado vencedor se limitou a beber Sumol, tirar fogaças do forno e dar beijinhos a todo o ser que lhe aparecia pela frente, e se calhar a algumas pedras, parece difícil vislumbrar a necessidade efectiva de Portugal ter um Presidente eleito directamente pelo povo. Já se sabe que a Constituição atribui poucos poderes ao Presidente, como aliás se viu com os patéticos ou tenebrosos (não sei bem qual o adjectivo mais adequado) acontecimentos que levaram Costa ao governo. Na realidade, o Presidente acaba por frustrar. Mais dia menos dia era bem melhor mudar-se o sistema, ou para um sistema presidencial típico ou para um sistema parlamentar. Esta coisa que temos só cria fricção e frustração. Quanto à ideia que o Presidente é um árbitro, isso não é verdade. Árbitro é o povo. E quanto àquela outra ideia mirífica, quase do domínio do religioso, da magistratura de influência, nunca a vi

Presidenciais: vitórias e derrotas (4)

Marcelo Rebelo de Sousa conta nestas eleições presidenciais com uma vitória prévia que, com mais ou menos votos, ninguém lhe tira: foi uma candidatura claramente independente, movida e mantida pelo próprio que desde o seu início e, até à véspera da votação, tem aparecido sempre como ganhadora à primeira volta. O que dá maior peso a essa vitória pessoal são três pormenores reveladores: por um lado, esteve no terreno quase sem contar com os aparelhos dos partidos que, em termos eleitorais, são a sua base “natural”; por outro lado, pôs todos os restantes candidatos partidarizados a criticarem-no praticamente todos os dias (as críticas generalizadas, algumas vezes demagógicas, devem contribuído mais para a sua notoriedade e para o vitimizarem do que para lhe retirarem votantes); e, finalmente, criou o deserto à sua volta – não apareceu mais nenhum candidato “da direita” ou “do centro-direita” (a imprensa nunca se entendeu nesta classificação taxinómica). Todas as sondagens, todas elas

Presidenciais: vitórias e derrotas (3)

O PS é e será o grande derrotado destas eleições presidenciais e já o foi logo à partida.  Por um simples e básico motivo: o segundo maior partido do leque partidário português, o partido do actual governo (que conquistou por um golpe de Estado parlamentar) e o maior partido da “esquerda” não conseguiu ter um candidato único, nem tão pouco apresentar-se unido, contra o candidato único da “direita”.  Depois deste ponto de partida, tão trágico como caricato, a situação ainda se agravou. O PS “costista” cristalizou-se em torno de Sampaio da Nóvoa e a restante oposição interna apoiou Maria de Belém. E não se pouparam nas críticas. O resultado não poderá deixar de ser obviamente mau: a sondagem que temos vindo a citar indica que Sampaio da Nóvoa terá 16,6 por cento dos votos e que Maria de Belém ficará com 16,3 por cento. Os resultados das legislativas de há três meses deram ao PS unido 1 174 730 votos e 32,33 por cento na repartição dos votos. Poderá haver quem diga, se os votos dos

Presidenciais: vitórias e derrotas (2)

Há quatro derrotados óbvios e a derrota de dois deles estende-se aos dos próprios partidos de cujas entranhas, digam o que disseram quanto à sua categoria unipessoal, saíram. Nas eleições legislativas de Outubro do ano passado, o BE e o PCP tiveram, respectivamente, 550 945 votos e 10,19 por cento e 445 901 votos e 8,25 por cento. Esta sondagem (do “Expresso”) a que nos referimos dá a Marisa Matias (BE) uma percentagem de 4,8 por cento e a Edgar Silva (PCP) uma percentagem de 4 por cento. Argumentar-se-á, como sempre, que “as sondagens valem o que valem” mas há três factos iniludíveis:  (a) se os resultados dos candidatos do BE e do PCP nestas eleições forem inferiores aos das legislativas, terão os dois partidos sofrido uma primeira derrota em termos muito simplesmente factuais;  (b) a derrota será sempre mais pesada quando se atende ao facto de a apresentação destes candidatos ter visado a fixação dos eleitores dos dois partidos; e  (c) ambos puseram como desígnio supremo

Presidenciais: vitórias e derrotas (1)

Se o resultado definitivo das eleições presidenciais deste domingo vai depender dos votos dos eleitores, nesta fase final de uma campanha em que há dez candidatos já é possível fazer previamente um apuramento das vitórias e derrotas. Ou, mais exactamente, da vitória e das derrotas e em termos políticos. Porque, mesmo sendo as candidaturas individuais, as mais destacadas estão estribadas em intervenções políticas e partidárias e as outras, ditas independentes, estão naturalmente estribadas em projectos políticos de natureza pessoal e, mesmo num caso, com uma ambiciosa perspectiva partidária muito clara. Poder-se-á dizer que esta abordagem é irrealista porque os votos não estão lançados nem contados mas, à luz das sondagens conhecidas e das regras comuns de experiência política, alguém duvida de que já existe um vencedor antecipado e que o protagonismo dos outros nove não é mais, mesmo onde não há “bluff” e a vontade é sincera, um simples “wishful thinking”? Comecemos pela pelas t

A cagada

Confesso que não me ocorre palavra mais distinta face ao que começa a ser a presente governação. Tive esperança. Embora simpatizasse com a determinação de Passos Coelho, discordava em absoluto da política financeira e económica do anterior governo e suspeitava dos números positivos apresentados em Agosto/ Setembro, portanto tinha alguma expectativa neste governo. Ainda tenho na área da saúde onde vi um ministro sabedor, calmo, equilibrado, e por outros motivos tenho boa impressão da nomeação para dirigir o Hospital de São José. Mas tudo o resto parece estar a transformar-se num perigoso Carnaval. O retorno dos feriados é simpático, mas um sinal desnecessário, que vai transformar Portugal num país de pandeireta que não sabe passar sem feriados...Depois veio a trapalhada do Banif. Zumba, aí foram três mil milhões pelo cano abaixo...Depois apareceu o inane ministro da Educação a falar sobre a nocividade dos exames. Mandemos o ministro de volta para Cambridge para curar o cancro onde

Presidenciais: a coisa das causas

25 de Abril e Liberdades, Ambiente e Alterações Climáticas, Assuntos Constitucionais, Cidadania Sénior, Cidades e Desenvolvimento Territorial,  Combate à Pobreza e Exclusão Social, Conhecimento, Cultura, Desporto, Diáspora, Economia e Inovação, Igualdade de Género e Combate às Discriminações, Juventude, Língua Portuguesa, Mar, Movimentos Sociais e Cidadania, Segurança e Defesa, Serviços Públicos, Trabalho, União Europeia. O que significa este conjunto de palavras, algumas delas combinadas entre si? Tudo e mais alguma coisa. Etiquetas sociais e/ou políticas. Problemas por resolver ou resolvidos. Enumerações de temas de relevância… bem, generalizada ou só em parte? Isto são “causas”. E estas “causas” (problemas resolvidos, por resolver ou assim-assim?) saem directamente do programa ou, melhor, para sermos rigorosos, do site da candidatura presidencial do antigo reitor universitário Sampaio da Nóvoa.  Se o que lá estão a fazer, por si, não é compreensível, a única explicação para a

A campanha dos disparates demagógicos (4)

Paulo Morais, “o candidato que por cada pontapé numa pedra da rua ou por ter pisado cocó de cão descobre um corrupto” (na divertida apreciação do comentador e jurista João Gonçalves), voltou a garantir, há dias, que, se fosse Presidente da República, demitiria um governo se o primeiro-ministro “mentisse” ao povo porque estaria “em causa, do meu ponto de vista, o regular funcionamento das instituições, circunstância na qual, nos termos constitucionais, o Presidente da República pode e deve demitir o Governo”.  Já antes disto, chegara a dizer que faria o mesmo se um governo saído de eleições não “cumprisse as promessas” feitas nas eleições. É mais um exemplo: ou não conhece realmente as competências presidenciais ou então, conhecendo-as, Morais está a prometer ao eleitorado ignaro uma coisa que não pode cumprir e apenas para ganhar votos. No primeiro caso, é disparate. No segundo, é demagogia. Não há cabeleira esfusiante que o disfarce. Pedro Garcia Rosado

A campanha dos disparates demagógicos (3)

Sampaio da Nóvoa esgrime o derradeiro argumento contra Marcelo Rebelo de Sousa: “ninguém tem dúvidas em quem é que votará o Dr. Cavaco Silva, não é? Em Marcelo.” Talvez alguém deva dizer ao ex-reitor que ninguém tem dúvidas de que José Sócrates votará nele. Pedro Garcia Rosado

A campanha dos disparates demagógicos (2)

O candidato presidencial Cândido Ferreira garantiu numa televisão que ia promover a alteração da Constituição para conseguir qualquer coisa relacionada com a Assembleia da República que, muito francamente, não me ficou na memória.  Isto assim dito parece coisa de somenos. A Constituição é assunto dos deputados, portanto… porque não? O Presidente da República, lá do alto do seu cargo, pode decerto ter alguma iniciativa nesse sentido. Ou não o deixam ter?  Claro que pode ter mas ela nunca deixará de ser simbólica, na melhor das hipóteses, porque a alteração da Constituição é competência do Parlamento. E no actual quadro constitucional o Presidente da República não pode forçar a alteração da Constituição. Pode propô-la ou sugeri-la mas se os deputados (e a Constituição está blindada com a exigência de votações por maioria de 2/3) não quiserem, não o fazem. Não levando a sua avante, o Presidente da República faria o quê? Um golpe de Estado mais ou menos constitucional como, por exempl

A campanha dos disparates demagógicos (1)

Uma visita a outro país de um chefe de Estado (normalmente, presidente em regime republicano ou monarca em regime monárquico) não se faz, sobretudo quando é uma visita oficial, dentro do estilo “Eh, pá, anda lá que se arranja qualquer coisa” ou “Eu levo a sobremesa”.  Dependendo do grau de rigor do protocolo e de quem o aplica, são estudados e/ou negociados dias da visita, modalidade da visita, ocasiões mais marcantes, acontecimentos abertos à imprensa, reuniões particulares, refeições, ementas e convidados. E também se faz tudo para que não haja um momento em falso ou em que o visitante seja apanhado numa situação embaraçosa. A candidata presidencial Maria de Belém Roseira resolveu prometer que, como Presidente da República, levaria os chefes de Estado a almoçar em lares de idosos, para verem… enfim, nem se sabe bem o quê.  Há duas situações possíveis: ou o lar de idosos é especialmente apoiado por uma qualquer instituição do país do visitante ou não é, e a ideia seria apenas d

Presidenciais: onde está o Wally? (3)

E Marcelo Rebelo de Sousa conseguirá ganhar as eleições? À partida, sim. Pode dizer-se que tem tudo a seu favor, sobretudo por comparação com os restantes candidatos. Não é um desconhecido e a exposição mediática está assegurada, pelo menos desde que passou da rádio para a televisão. Conseguiu, diante das câmaras, substituir a postura do professor catedrático e autor de pareceres jurídicos por uma atitude mais simpática e mais afectuosa, moderando-se nos comentários e procurando mostrar que sabe de tudo um pouco, como um divulgador e não um comentador. E até pode ganhar um apoio mais emocional de quem o vê transformado no “bombo da festa” dos restantes nove. Por outro lado, não renegou objectivamente a “família” política e partidária e a popularidade que ganhou também lhe abriu portas na “esquerda”, apesar de se situar no campo da “direita” e não apenas no domínio político. Mas é aqui que pode estar a sua maior fragilidade. Da incursão na festa do “Avante!” em vésperas de se apr

Presidenciais: onde está o Wally? (2)

A “esquerda”, com os seus cinco candidatos, poderá vencer as eleições presidenciais? Não, e não será por completo arriscado dizer que nunca o conseguirá fazer, nestas eleições, à primeira volta. As candidaturas do PCP e do BE visam apenas a fixação dos respectivos eleitorados, com as suas versões algo troglodita das respectivas prestações nas eleições legislativas, com discursos mais caceteiros do que os seus chefes partidários.  O que dizem não é a pensar no exercício do cargo presidencial mas a pensar no que os militantes e eleitores do PCP e do BE querem ouvir. Poderá ser interessante especular sobre o que seriam os mandatos presidenciais de Edgar Silva e de Marisa Matias mas o assunto é mais sério do que isso, já basta o governo que existe actualmente e nenhum deles (nem as suas hierarquias partidárias) pensa na realidade que lá chegará. E no PS? António Costa conquistou o Governo com uma frieza golpista que se julgava impensável no país dos “brandos costumes”. É possível qu

Presidenciais: onde está o Wally? (1)

É possível que Marcelo Rebelo de Sousa tenha encarado as eleições presidenciais como um desafio, objectiva e subjectivamente.  Tinha, um dia, de se submeter a uma eleição nacional e fazer por ganhá-la. Com isso desmentiria os que o acusavam de ser só “treinador de bancada” com resultados infelizes quando desceu à arena política (câmara de Lisboa e AD), e culminaria a sua vida pública com o mais elevado cargo do Estado numa altura em que ele, vazio, ficava mesmo a jeito. Por outro lado, e numa altura em que os resultados das eleições legislativas eram muito incertos, o presidente Marcelo seria, para o eleitorado do PSD e do CDS, a melhor das hipóteses se o PS chegasse legitimamente ao poder. A sua candidatura era natural. Mas num espectro político que, por referência aos partidos, abrangesse parte o PSD, o CDS e uma parte do PS. A sua vitória seria segura e talvez ainda mais segura se se afirmasse como uma candidatura individual e “independente”. O sistema constitucional portug