Salutar cepticismo

Impressiona a falta de sentido crítico que existe em Portugal, sendo certo que é a crítica que consegue fazer nascer o diálogo fundamentado e chegar próximo da verdade.
Recentemente, três episódios que podem ser como reportados ou ao contrário trouxeram essa acefalia para o extremo.
Em primeiro lugar, uma prestação de A.Guterres na ONU para efeitos de uma candidatura a secretário-geral da ONU. Foi-nos relatado por todos, o brilhantismo e espantosa garra intelectual do candidato, que infelizmente em Portugal só é conhecido por ter fugido...depois de ter começado o período de descontrolo das finanças públicas e descoberto aquelas estrelas políticas que são Sócrates e Vara.
Contudo, na realidade o que se viu foi um Guterres transfigurado em guia turístico a falar três línguas e explicar banalidades. Pode ter sido muito brilhante, mas não se viu qualquer espanto ou referência em qualquer areópago internacional. Deu a impressão de ser mais um dia na vida da ONU...
Em segundo lugar, o Presidente Marcelo fez um discurso no Parlamento. Mais uma vez se cantaram hossanas à prestação magnífica que foi aplaudida de pé. Bom, o que se viu foi Marcelo a dizer que a esquerda portuguesa era inofensiva, que Portugal era europeísta e ia cumprir tudo o que lhe mandassem, além de produzir aquela antinomia que diz tudo e nada: é preciso controlar as finanças públicas, mas garantir o crescimento económico. As bancadas do Parlamento Europeu pareciam semi-vazias, e o que se viu bem foi Marisa Matias a levantar-se para aplaudir. Obviamente, que foi a forma que o BE encontrou para compensar a ausência de entusiasmo na posse de Marcelo, que tão impopular foi. Portanto, Marcelo foi a Estrasburgo para dar a oportunidade ao BE de o aplaudir. De resto, mais uma vez não se viu nada de especial. 
O terceiro episódio é a nomeação de Elisa Ferreira para o Banco de Portugal. Pode estar certa, pode ter perfil, pode ter tudo. Mas o interessante é a barragem jornalística que se fez a assegurar que era uma escolha magnífica, excelente. Mais uma vez, até pode ser, mas não é por isso que não estamos perante a escolha de um alto dirigente do PS para o Banco de Portugal (já se devia ter aprendido com Constâncio, outro génio da praia lusitana).
Estas pessoas serão todas brilhantes, magníficas, mas por isso mesmo devem ser sujeitas a escrutínio aturado e a um salutar cepticismo, para não enfiarmos mais barretes.

Alexandre Cavallieri

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