A liberdade de imprensa constará do acordo secreto?

Miguel Sousa Tavares é jornalista, foi advogado, escreveu alguns romances de êxito e tem dois espaços de opinião com audiência assegurada no “Expresso” e na SIC. É filho de duas figuras ilustres: Sophia de Melo Breyner (poetisa) e Francisco Sousa Tavares (advogado e político) e tem uma relação familiar com o banqueiro Ricardo Salgado.
Tavares foi uma das vozes, entre jornalistas, comentadores e articulistas, que apoiou António Costa, o secretário-geral do PS que quer ser primeiro-ministro à viva força. Tavares não gostava de António José Seguro (oriundo da província e que resolveu fixar-se na província) nem de Pedro Passos Coelho (oriundo da província e que resolveu fixar-se numa zona suburbana da capital). 
Nem Seguro nem Passos Coelho pertenciam ao pequeno mundo da intelectualidade lisboeta. Como Tavares, Costa também proveio dessa origem, filho do escritor Orlando da Costa e da jornalista Maria Antónia Palla (que não se opôs ao fecho, por José Sócrates, da Caixa da Previdência e Abono de Família dos Jornalistas, a que nessa altura presidia), sendo ainda da linhagem aristocrática hindu dos brâmanes.
Costa cultivou, aproveitando a facilidade do contacto e dos meios comuns, alguma familiaridade com os jornalistas, que foi aproveitando e tolerando. A sua aura de “salvador” anti-austeridade facilitou o resto.
Foi por tudo isto, e por mais algumas cumplicidades discretas, que Costa conseguiu ser levado aos ombros pela comunicação social durante o longo período de gestação do político calculista que deporia o rival e que até acenou com uma maioria absoluta nas eleições de 4 de Outubro.
Mas quando as coisas começaram a correr mal, Costa mostrou ao que vinha: atacou por SMS um jornalista e invectivou outro, em directo, na televisão. Depois perdeu as eleições. E depois começou a sua maratona de golpes políticos para não perder o lugar, no PS e na presidência do Conselho de Ministros. E, com ela, as críticas a quem até então pouco as escutava.
Voltemos a Miguel Sousa Tavares. No sábado passado, no “Expresso”, Tavares ataca Costa e os seus aliados do BE e do PCP. E não se poupa nas palavras. Não é caso único mas vale sobretudo pela amplitude da coisa. Como Tavares, a crítica à ambição de Costa generalizou-se hoje na comunicação social. E é interessante verificar que o denominador comum das críticas converge em dois pontos: a recusa de se demitir do cargo de secretário-geral do PS ao perder as eleições (até Sócrates o fez...) e a aliança com o PCP. 

A “ménage à trois” é que é pior...

É possível que, se Costa se tivesse ficado pelo casamento político com Catarina Martins, o poupassem mais. A dirigente do BE caiu no goto de parte significativa das audiências e pode dizer-se que se a apresentadora Catarina Furtado foi apresentada como “namoradinha dos portugueses” (ou algo semelhante), Martins merece o cognome de “namoradinha dos intelectuais portugueses”. 
No caso do PCP, porém, se Jerónimo de Sousa pode encantar os saudosistas de um qualquer avô, o pior é o resto: a história sombria do comunismo, sobretudo na era de Estaline e quando tudo se desmorona ao ritmo da queda do Muro de Berlim.
Costa, como putativo chefe de governo, não beneficia do “estado de graça” que vigora nestas circunstâncias. Não é de surpreender que também não venha a beneficiar quando alcançar a meta minimalista da sua vida política.
E, nessa altura, como irá Costa reagir? Sócrates, que não gostava de jornalistas incómodos, era discreto nas reprimendas. Costa nem tenta ser discreto. O modo como o PCP encara a comunicação social está bem patente nos casos históricos (o “Diário de Notícias” de José Saramago e Luís de Barros e “o diário” de Miguel Urbano Rodrigues e de António Borga, e o caso recente das agressões na Festa do “Avante!”, rapidamente consideradas “campanha”). Quanto ao BE não há registo, ainda, mas as vertentes maoísta (via UDP) e trotzkista que nele convergem não prometem nada de bom nesta matéria.
Seria interessante saber se, no acordo secreto que andam a negociar, há alguma referência à liberdade de imprensa e à Lei de Imprensa...

Costa Cardoso

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