Eleições presidenciais: os limites da ambição (1)

Quem se der ao trabalho de ir ler os quinze pontos do artigo 133.º da Constituição da República Portuguesa, cotejando-os com o artigo 195.º, por exemplo, poderá ver que o cargo de Presidente da República não favorece uma grande acção política. 
O Presidente pode pouco, em matéria de políticas, e é também por esse motivo que tanto se fala em “magistratura de influência”. Porque pouco mais lhe resta, em circunstâncias normais, do que a capacidade de influenciar, ou de o tentar fazer, o Governo ou a Assembleia da República, por exemplo.
Por outro lado, não se pode dizer que a sua remuneração seja um factor de atracção. O Presidente da Republica não chega a ganhar 10 mil euros por mês e os gestores de topo no sector privado ganham bastante mais do que isso.
A fama que advém do cargo é passageira. Com sorte e bons relacionamentos no exterior, um ex-Presidente da República pode ambicionar a um qualquer cargo institucional internacional ou a uma carreira de orador que seja bem paga. Em território nacional, se ficar quase mudo e quedo, ficará consensualmente bem visto. Se soltar ocasionalmente uma lágrima compungida, melhor ainda. Se se pronunciar muitas vezes, sobre tudo ou quase tudo, e dividir opiniões, a aura institucional depressa se esbate. Toda a gente quer um Presidente consensual.
Além de um lugar na História e de um retrato em Belém, o que pode ter mais que lhe seja proveitoso?
Aparecer na televisão, como é evidente. E talvez seja essa a grande vantagem da coisa. Com a próxima eleição presidencial marcada para Janeiro /(ou seja, daqui a dez meses), quem se lança por esta altura como candidato beneficiará de cerca de 300 dias de tempo de antena noticioso. É bom para o ego, satisfaz a vaidade e é um bom investimento: não ganhando as eleições, pode tornar-se um bom vendedor. Criar um partido novo e percorrer esse caminho pejado de pedras é uma maçada muito maior. E uma derrota em eleições legislativas que não deixe entrar no Parlamento é muito pior. Nas eleições presidenciais não é. Porque só um é que pode ganhar.
As eleições presidenciais de Janeiro de 2016 não têm, até agora, candidatos “naturais”. Não pode haver uma recandidatura de quem está, não há um dirigente partidário nacional que se arrisque, não há uma individualidade com notoriedade pública que chegue a este ponto com uma carreira política que torne a Presidência da República uma função de corolário. António Guterres seria quase o único nessas condições mas, felizmente e a bem da Nação, deu às-de-vila-diogo.
Não admira assim que tenham proliferado os candidatos situados “à esquerda”, por ter sido onde mais se fez sentir a falta de uma candidatura “natural”. E o vazio tem sido, como tenderá a ser, estimulante. A lógica é esta: não há um candidato forte, portanto talvez eu consiga.
Além do mais, iremos apenas eleger o quinto Presidente depois do 25 de Abril. Ainda é fácil fixar nomes. 
Mas qualquer candidatura é, naturalmente, apresentada como eivada das mais nobres intenções. Não há ninguém, como se não fossem seres humanos, que assuma a sua candidatura como fruto da ambição. 
Só que a ambição não é um pecado e não é um factor negativo. Estimula e encoraja os seres humanos a fazerem mais alguma coisa, a seu próprio favor, claro, o que – repete-se – não é um pecado. Não é crime. Não é coisa que, trilhando o próprio um caminho honesto, seja de levar a mal. O que se pode levar a mal é que, entrando-nos essa ambição pelos olhos adentro, o ambicioso candidato se faça de virgem púdica e se finja paladino de virtudes.
E o que se pode ver, a dez meses das eleições, é que parecem ser maiores as ambições mais descontroladas do que propósitos verdadeiramente nobres o que faz mover os candidatos, pré-candidatos e proto-candidatos. 

Pedro Garcia Rosado

Escritor e tradutor
http://pedrogarciarosado.blogspot.pt

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