A esquerda portuguesa tem medo dos juízes ?

Quando José Sócrates foi preso e não se ouviu nenhuma berraria por parte dos partidos de esquerda, pensou-se que a esquerda portuguesa  tinha percebido que Portugal estava a tentar construir um Estado de Direito. Há que não esquecer que foi a mesma esquerda que se opôs à inserção da concepção de Portugal como Estado de Direito na Constituição de 1976, por considerar que este era um conceito burguês que servia para perpetuar a opressão da classe dominante.
Não se quer com isto dizer que os juízes não tenham intenções políticas e em Portugal não  tenham dificuldade em lidar com a lei e sobretudo com os direitos fundamentais. Em todo o caso, o seu papel enquanto poder geométrico de uma Constituição harmoniosa é fundamental. Ou dito de outra forma, os juízes devem intervir politicamente, quando o sistema jurídico-constitucional não funciona, está em perigo, assenta numa só pessoa ou partido e ameaça as liberdades. Foi o que se passou com Sócrates, e a intervenção judicial só pecou por muito tardia. E agora peca por estar dotada de alguma inépcia. Mas é melhor que nada.
Face a isto é com perplexidade ouvir a esquerda portuguesa surgir conivente com os desmandos de Lula e Dilma e acusar os juízes brasileiros de golpe de Estado. Porquê Golpe de Estado? Querer investigar ou prender um antigo Presidente é golpe de Estado em que sentido? Lula não é o Estado, não representa o Estado, portanto qualquer processo contra ele não é golpe de Estado. Pode ser injusto, pode conter ilegalidades, mas não é golpe de Estado.
Porque quanto a Dilma não há movimentos judiciais. Há um movimento de impeachment no Congresso, previsto na Constituição. Movimento que já tinha sido ensaiado contra Collor de Mello, e nos EUA contra Andrew Johnson, Richard Nixon ou Bill Clinton.
Os juízes fazem o seu trabalho, umas vezes melhor, outras vezes pior. A única vantagem é que há recursos e habitualmente em 10 juízes maus, surge um bom.
A democracia não é só o voto popular, é um sistema em que o juiz independente e imparcial tem tanta ou mais importância que o voto, sobretudo para garantir a liberdade, o direito e a igualdade. Já referia o filósofo do direito Dworkin que muitas vezes os órgãos de origem não maioritária têm um papel fundamental para garantir a Constituição igualitária. É disto que se trata no caso de Lula e de nada mais. Estranho é não se perceber.

Adenda

Segundo esta notícia do PÚBLICO é toda a classe política portuguesa que tem medo, e não só a esquerda...Tenho a sensação que Portugal nos últimos anos tem uma política externa cobarde. Está sempre do lado errado. Foi contra Nelson Mandela, a favor de José Eduardo e Isabel dos Santos, a favor de Chavez, a favor das loucuras de Bush (júnior) no Iraque. Não acertamos uma? Somos seguidistas de quê? Devíamos, de alguma forma, apoiar a oposição no Brasil, em Angola, na Venezuela, etc.

Temístocles Menor

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