O fim do jornalismo português (3)

Em 19 de Fevereiro de 2018, o “Diário de Notícias” garantia que “Portugal quer entrar no roteiro de grandes produções de Hollywood” e contava que uma missão estatal andava por Los Angeles a tentar convencer produtores americanos a filmarem em Portugal, oferecendo qualquer tipo de prémio monetário, 300 dias de sol por ano e mais qualquer coisa. 
Para o jornal e para quem assinava a notícia, parecia ser algo de extraordinário. Decerto que só para os visitantes que foram a Los Angeles aproveitar a viagem porque o resultado deve ser tão espectacular como o das várias iniciativas do género que houve em, pelo menos, 25 anos.
O padrão tem sido sempre este: o País oferece sol e mar e os míticos americanos de Hollywood vêm para cá filmar. Pelo meio há uns americanos que se metem no negócio e que são sempre grandes produtores de origem portuguesa. Alguns presidentes de câmara oferecem “cidades do cinema” (Cascais e Loulé) e o resultado também dá inquéritos no DIAP e arguidos. 
A situação é, toda ela (e como o jornalismo de agora gosta de escrever), improvável. Como jornalista, escrevi sobre ela e precisei de apenas duas coisas: o conhecimento do cinema como indústria (aprofundado quando fui, por pouco tempo, correspondente do “Variety” em Portugal) e alguma investigação jornalística dentro de portas. 
Em termos práticos, e nada mudou, nenhum produtor americano atravessa o Atlântico para vir fazer filmagens num país onde não há estúdios e instalações para a pós-produção. Em Inglaterra existe isso tudo e nos países da Europa de Leste (onde havia, e há, indústria cinematográfica) também, e com preços mais baixos. Uma das pessoas que mo explicou, numa fase em que já nem os produtores europeus vinham em regra para Portugal, foi o produtor português Henrique Espírito Santo. Não podia ter sido mais didáctico nem mais claro, sábio e experiente como era, e é.
O jornalismo exigiria, no caso desta notícia mais recente do descaracterizado “DN”, que se procurassem iniciativas semelhantes e, depois, se elas deram resultado. O “DN” até tem um arquivo de décadas. Ou, pelo menos, tinha. E mesmo que o/a jornalista não conseguisse retomar outros casos (o de Loulé, no entanto, está no Google), talvez devesse ir fazer alguma pesquisa. 
A alternativa é, virando as costas à investigação mais básica, deixar que o jornalismo sirva de veículo de propaganda. Este caso é apenas um exemplo de como o jornalismo se resume à propaganda. E, se é isso, vale a pena existir? Não.

Pedro Garcia Rosado


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